A adoção de ferramentas de automação de marketing pode constituir um desafio para muitas empresas por não dominarem a totalidade do potencial que estas encerram, mas também e sobretudo porque o sucesso da implementação deste tipo de software está diretamente ligado às condições e às respostas do mercado, sobretudo comportamentos de clientes e concorrentes, as quais estão num fluxo constante de mudança, o que acarreta um aumento da incerteza. (Chetty, Ojala, & Leppäaho, 2015; Read, Dew, Sarasvathy, Song, & Wiltbank, 2009, cit in: Tarkiainen, et al., 2020). Apesar disto, os colaboradores de marketing têm que estar conscientes das oportunidades que emergem da automação, “mas também da acrescida responsabilidade pelos resultados económicos, que advém com qualquer investimento.” (Klaus, 2021)
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O facto de ser difícil de controlar os resultados da adoção de uma plataforma de automação, e até imprevisível, leva a que muitas vezes os decisores começam este processo de implementação com aspirações gerais, mantendo uma atitude flexível, de aprendizagem pela prática, explorando as contingências ambientais, à medida que elas vão surgindo, por oposição a definirem objetivos claros e rígidos desde o início (Tarkiainen, et al., 2020). O que por si só não é necessariamente negativo, pelo contrário, pode até ser particularmente benéfico, pela atitude de pioneirismo e exploração que devem existir no arranque de um projeto desta natureza.
Este comportamento deve-se também à mudança da natureza da atividade de marketing nos últimos anos, Thomas Davenport (et al, 2016) chega a firmar que “os planos anuais estratégicos de marketing são uma relíquia do passado. Em vez de fazerem algumas grandes decisões a cada ano, as empresas e as suas agências fazem agora literalmente centenas de decisões automatizadas em tempo real por dia”. Essas decisões podem ser relativas ao “tipo de anúncios que correm em que sites, aos termos de pesquisa que devem comprar, à versão de um conteúdo web a adotar, às mensagens a colocar em emails, até à forma como personalizar toda uma experiência digital.”
Davenport (et al, 2016) destaca os atributos que fazem com que uma organização esteja orientada com sucesso à automação, nomeadamente, o acesso e uso intensivo de dados de marketing, competências em analítica e ciência de dados, a capacidade de lidar com múltiplos fornecedores e tecnologias de relação com o cliente, o suporte de fornecedores de serviços de marketing altamente especializados, a forte proximidade aos departamentos de IT e o suporte da liderança executiva de marketing.
Estes atributos atestam a ideia veiculada por Brian Harrington, CMO da Zipcar, de que “estamos a fundir arte e ciência, e todos precisam saber alguma coisa sobre ambos estes domínios”, ou Matt Greitzer, fundador da agência Accordant, que disse que “temos de ser capazes de traduzir dados em estórias” (cit in: Davenport, et al, 2016).
Davenport (et al, 2016) lista ainda o que as empresas devem fazer para se prepararem para um futuro automatizado, nomeadamente:
- Adotar automação de imediato para todo o tipo de tarefas e decisões repetitivas e codificadas
- Listar as decisões chave de marketing que a organização toma e medir o seu potencial de automação
- Envolver os colaboradores de marketing na análise de decisões de automação
- Mapear os dados necessários para permitir automação de marketing
- Desenvolver competências tecnológicas nas várias componentes e automação de marketing
- Avaliar o ecossistema de parceiros e fornecedores de software para determinar as suas capacidades de entregar projetos automatizados de marketing
- Criar casos de negócio que expliquem os fatores determinantes, âmbito e impacto financeiro da automação de marketing
Como alinhar as equipas na implementação da Plataforma de Automação de Marketing
Parte fundamental do sucesso de um projeto de implementação de automação de marketing é o envolvimento de todos os departamentos e pessoas, que tenham parte ativa na adoção do sistema, já que muitos projetos tecnológicos falham devido às resistências que os colaboradores levantam quanto à sua utilização. “É por isto que é tão importante envolver todos os stakeholders desde o início e identificar casos de uso concretos, baseados nas prioridades do negócio. As pessoas aceitam a mudança mais facilmente quando elas próprias estão envolvidas e essa mudança as ajuda atingir os seus objetivos.” (Klaus, 2021)
No contexto B2B, em particular, o sucesso da implementação depende imenso do claro alinhamento entre equipas de marketing e vendas, e da consciência transversal sobre a importância que o conteúdo de marketing desempenha em todo este esforço. De acordo com um estudo de 2019 (Nutley e Greogiradis, 2019), 34% das empresas inquiridas vê a cooperação entre o marketing e as vendas como um dos maiores desafios à automação de marketing.
É importante recordar as frequentes contrariedades que afetam as relações entre equipas de marketing e vendas, uma vez que o marketing muitas vezes é acusado pelas equipas vendas de gerar leads de baixa qualidade, por outro lado, o marketing muitas vezes acusa as vendas de não fazerem um trabalho de seguimento às leads conveniente (Biemans, Brencic, & Malshe, 2010; Homburg & Jensen, 2007; Homburg, Jensen, & Krohmer, 2008, cit in Järvinen, et al., 2016).
Marketing e vendas devem cooperar também na conceção da jornada do cliente e seu ciclo de vida, na definição de objetivos para os KPI, tais como número de potenciais clientes passados do marketing às vendas (SQL – sales qualified leads), critérios de pontuação (scoring) para medir a probabilidade de compra, na avaliação regular da qualidade das leads e na partilha conjunta da responsabilidade por cada contacto independentemente do estágio em que se encontra. (Mrohs, 2021)
Por fim, a atuação do marketing de ser orientada às vendas, “quando o foco do marketing está apenas no branding, comunicação institucional ou relações-públicas, o benefício da automação é limitado. Por contraste, as empresas que mais beneficiam da automação de marketing têm o foco na criação de procura (demand generation) e objetivos de marketing bem definidos ao nível do pipeline de oportunidades e de fecho de negócios”. (Klaus, 2021)
Como gerir a mudança na organização
A medida de sucesso da implementação e adoção de automação de marketing está muito para além do mero uso da tecnologia. Para M. Park e Sung Hong (2020), a adoção bem-sucedida de automação de marketing só acontece quando “a nova tecnologia é usada para automatizar processos existentes de marketing e para interagir com clientes de um modo digitalizado e de forma a alcançar resultados visíveis”. Para que isto aconteça há que abandonar a perspetiva da adoção da tecnologia e seguir uma perspetiva da transformação do marketing através de uma “abordagem passo a passo, que tem em consideração as dinâmicas e processos de adoção” e que leva em conta a visão da liderança de topo.
Para estes autores, tal abordagem foi desenhada por Kotter (1995) no seu modelo sequencial de oito passos para a gestão a mudança. O modelo de Kotter, advoga que para uma gestão da mudança com sucesso, primeiro há que se 1) estabelecer um sentido de urgência dentro da organização, depois há que 2) formar coligações, 3) criar uma visão para a mudança, 4) comunicar e motivar à mudança, 5) capacitar e dar condições para que a ação de mudança se inicie, 6) criar pequenas vitórias no curto prazo, 7) expandir a abrangência da iniciativa de mudança e por fim 8) garantir a sua estabilização e permanência no futuro da organização.
Park e Hong (2020) aplicaram este modelo no estudo de caso da implementação de automação de marketing na Microsoft e concluíram que, quando se trata da adoção de automação de marketing, alguns destes passos não devem ser seguidos de forma sequencial. Particularmente, os passos 4 e 5, o quais são tão mais eficazes quanto mais concatenados estiverem. “O caso da Microsoft, demonstra que a adoção é muito eficaz quando os marketers adotam a automação no exato momento em que a motivação e os recursos necessários são fornecidos em simultâneo.”
Este caso está repleto de muitas outras aprendizagens de enorme valor sobre gestão de mudança na adoção de automação de marketing. Charler Eichenbaum, senior product marketing manager, responsável pelo projeto de automação de marketing na Microsoft, citado por Park e Hong (2020), fala sobre uma primeira experiência falhada em 2013, dizendo que “nós simplesmente implementámos a tecnologia, sem pensar nos processos de negócio, organização e naquilo que estávamos a tentar mudar. Atuámos com miopia, julgando que a partir do momento em que a tecnologia estivesse a funcionar, isso iria resolver os problemas.”
Um ano depois, um segundo esforço de implementação de automação resultou em sucesso. O que Park e Hong (2020) observaram com pormenor no processo de adoção de automação de marketing, neste segundo caso, mediante o modelo de gestão de mudança de Kotter, pode resumir-se da seguinte maneira:
- O sentido de urgência de transformação do marketing foi despoletado pelo novo CEO da Microsoft, Satya Nadella, e operacionalizado pelo CMO, Chris Capossela, que chega a declarar: “a Microsoft tem que transformar o seu marketing nos próximos três anos ou arrisca-se a falhar.”
- Quanto à formação de coligações para a adoção de automação de marketing, foi dada total autonomia e autoridade à equipa responsável pela implementação, sem que houvesse qualquer interferência das chefias superiores, o que permitiu o pragmatismo da inovação de baixo para cima (bottom-up innovation).
- A visão para a adoção da automação de marketing baseou-se em três princípios: 1) começar em pequena escala, atacando áreas de elevada probabilidade de sucesso; 2) ignorar a integração com sistemas já existentes (legacy), uma vez que a complexidade e tempo que estes projetos consomem aumenta a probabilidade de fracasso e limita a independência da equipa; 3) aceitar o erro e abraçar uma abordagem de experimentação, que é dirigida por uma sucessão de pequenos objetivos pouco onerosos ou urgentes.
- A comunicação da visão para a automação de marketing foi difundida por toda a organização através de um programa piloto que incentivava à participação voluntária das equipas de marketing nas várias subsidiárias espalhadas pelo mundo, criando-se assim uma comunidade de partilha de conhecimento e boas práticas, em que a comunicação era bi-direcional entre a equipa responsável pela implementação da automação de marketing e os restantes membros da comunidade.
- Quanto à capacitação para a adoção da automação de marketing, foi criado um centro internacional (Azure Demand Center) cujas principais funções eram as de estabelecer estratégias, fornecer infraestruturas de automação de marketing, desenhar processos, fornecer materiais de comunicação para as campanhas globais e fornecer conteúdos formativos.
- As vitórias de curto prazo surgiram por via da sistematização de todas as atividades de marketing, do aumento da eficiência e produtividade de marketing e vendas, da mensuração agregada da performance de marketing, que passou a estar ligada aos resultados de vendas. A automação de marketing permitiu alcançar uma taxa anual de crescimento de 9% na unidade de negócio alvo do projeto piloto (Microsoft Azure).
- A consolidação da iniciativa de transformação surgiu naturalmente com o alargar da automação de marketing a todas as áreas de negócio e produtos da Microsoft, como consequência dos bons resultados do projeto piloto.
- A institucionalização da transformação do marketing e da automação dá-se com a integração de sistemas. Park e Hong (2020) destacam que “apesar da integração de sistemas ser um elemento essencial, é interessante notar que o trabalho técnico de integração ocorreu apenas depois da implementação completa de automação de marketing e não foi sequer considerado no início do processo.”
Quais as competências necessárias na equipa?
Tal como se viu com o caso da Microsoft com a escolha da unidade de negócio Azure para o projeto piloto de automação, as políticas de marketing-mix devem informar quais os principais atores numa implementação de automação de marketing, uma vez que são estas políticas que determinam a orientação dos investimentos e produtos em relação aos quais maior retorno é possível obter numa fase inicial.
Além disto, Klaus (2021) defende que deve haver uma integração alargada de todas as funções que possam estar ligadas à automação, mantendo uma comunicação ampla e frequente entre todas as pessoas. Marketing e vendas têm de estar envolvidos desde o início, mas é ao marketing que cabe a responsabilidade pelo processo de implementação, e em particular à função de Marketing Operations (operações de marketing), uma vez que é esta função que tem o conhecimento dos processos internos, das pessoas envolvidas e da tecnologia.
Na fase final do projeto, Klaus releva a importância da função de analista de dados, cujo objetivo é a otimização da automação de marketing a partir dos resultados e leituras reais das respostas do mercado. A equipa central deve ainda contar com as áreas de marketing de conteúdos, marketing digital e de performance marketing (ou campanhas). A gestão de topo, o departamento de IT e de serviço ao cliente também devem participar com maior intensidade em determinadas fases do projeto, tal como Klaus esquematiza na tabela abaixo.
Como escolher plataforma de Automação de Marketing certa para a sua empresa?
Referências
- Mero, J., Tarkiainen, A., & Tobon, J. (2020). Effectual and causal reasoning in the adoption of marketing automation. Industrial Marketing Management, 86, 212-222.
- Nutley, M., & Greogiradis, L. (2019). The state of marketing automation 2019. Retirado a 18 de maio de 2020.
- Klaus, Lutz (2021). Marketing Automation: Exploring the Process Model for Implementation. Management for professionals. Berlim: Springer 229 – 245
- Järvinen, J., & Taiminen, H. (2016). Harnessing marketing automation for B2B content marketing. Industrial Marketing Management, 54, 164-175.
- Mrohs, Alexander (2021). Marketing Automation: Defining the organizacional framework. B2B Marketing: A guidebook for the classroom to boardroom. Management for professionals. Berlim: Springer 211 – 227
- Hong, S. H., & Park, M. J. (2020). Dynamics of marketing automation adoption for organisational marketing process transformation: the case of Microsoft. International Journal of Electronic Customer Relationship Management, 12(3), 205-224.
- Kotter, J.P. (1995). Leading change: Why transformation efforts fail. Harvard Business Review, Vol 73. No. 2, pp 59-67
Artigo escrito por:
Tiago J. C. Sousa
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[…] pode envolver uma série de medidas, como investir em tecnologia de automação de marketing mais avançada, integrar sistemas de automação de marketing com outras fontes de dados e alinhar equipas e […]